12 de junho de 2019

Mãe Coragem

Foto: Jennifer Glass

O espetáculo "Mãe Coragem" fica em cartaz no ginásio do Sesc Pompeia até 21 de julho. Escrita em 1941, a peça se passa durante doze anos dentro da Guerra dos Trinta Anos (1618-1648), uma série de batalhas devastadoras na Europa central, sobretudo na Alemanha, que deixaram mais de oito milhões de mortos. Nesse contexto, o texto narra a trajetória de Anna Fierling, a dita Mãe Coragem, uma comerciante que acompanha as tropas com sua carroça, vendendo suprimentos para os soldados agonizantes. Ela comemora a chegada da guerra e lucra com seus horrores, mas não quer que nenhum de seus três filhos – Eilif, Queijinho e Kattrin – sejam convocados para a luta.
“Acho que a Mãe Coragem é uma espécie de Hamlet das mulheres, ou melhor, seu oposto complementar. Em Hamlet você tem que ser um ator maduro e jovem, e em Mãe Coragem você tem que ser uma atriz madura e velha. Então, geralmente você tem disposição para fazer quando é jovem, mas tem que esperar ficar mais velha. E Hamlet você quer fazer e não tem maturidade quando você é jovem, né? Mas eu sempre achei muito difícil, li várias vezes, mantive esse desejo remoto, e sempre guardei na estante, como uma perolazinha”, diz a idealizadora da montagem Bete Coelho.
A encenação de Daniela Thomas destaca o caráter dialético no texto de Brecht. “Quando recebi o convite de Bete para dirigir o Mãe Coragem, logo imaginei uma trupe de atores chafurdando na lama, num espetáculo que não se dirigisse ao público, mas que fosse testemunhado por ele. Ou ainda: que além de assistir os atores, o público, organizado em torno da arena, assistisse o clássico de Bertolt Brecht sendo visto por uma outra plateia, em mais um testemunho da alienação pretendida pelo diretor/filósofo. Enquanto discutíamos sobre a montagem, nesses anos, assombraram-nos os rompimentos das barragens de Mariana e Brumadinho: a lama inerte, implacável, que assassinou famílias, florestas e rios. Assombrou-nos também a luta diária dos pobres, pardos e negros do Brasil frente ao genocídio de seus jovens: nossa guerra particular. Assombraram-nos ainda os slogans intolerantes e cada vez mais vocais dos que falam em nome de Deus. Mãe Coragem é uma peça escrita nos anos de 1930 e 1940 do século XX, no norte da Europa, sobre a guerra religiosa que os assolou nos anos 1600 e ressoa atual e pertinente nos nossos tristes trópicos”, revela a diretora.