Nova Iorque estava um gêlo só. A neve caia por tudo quanto era lado. No Central Park as crianças se divertiam escorregando entre os flocos de algodão. Algumas ruas não se dava nem para andar, os moradores reclamaram com a prefeitura do serviço de limpeza, mas ainda assim, a cidade continuava com seu charme irresistível. Sofia entrou no moderno estúdio e já sentia a diferença da temperatura do lado de fora para o lado de dentro.
O simpático gerente entregou-lhe as chaves e explicou para ela como funcionava os aparelhos de refrigeração, aquecimento, lava-louças, forno e microondas do local. Disse-lhe quais eram as regras do condominio e cobrou-lhe adiantado o pagamento dos meses que ela iria ficar. No começo ela arregalava os olhos como se fosse entender melhor o que ele falava rapidamente, mas depois pediu-lhe que falasse devagar para que ela fosse acostumando-se com o sotaque norte-americano. A pedido dela, ele o fez. Então aos poucos ela foi relaxando e percebeu que seu inglês ainda dava para o gasto.
Assim que o gerente saiu, Sofia ligou o computador, conectou-se ao skype e tentou ligar pra casa. O telefone incansávelmente chamava, chamava, mas ninguém atendia. Vou deixar para ligar mais tarde, vai ver que eles foram jantar ou algo parecido. Achou estranho, pois quase eles nunca saiam de casa, mas pensou que eles poderiam estar aproveitando que estavam sozinhos e resolveram fazer uma pequena lua-de-mel.
Apesar de muito bem mobiliado o estúdio, Sofia foi ao supermercado mais próximo, comprou produtos de limpeza e fez uma faxina grossa para tirar as energias do povo que tivera alugado aquele espaço antes dela. Já com cheiro de casa limpa, a design de sapatos desarrumou as malas, olhou no relógio e naquela brincadeira já tinha se passado, pelo menos umas cinco horas desde quando tinha chegado. Resolveu que não ia ligar para os pais, pois, depois de ter feito as contas, adicionando às horas locais a diferença de fuso horário, achou que já era muito tarde e podia acordá-los. Além do mais a fome já estava mais do que batendo no estômago, ela estava em estado de desespero ou quase em petição de miséria.
Sofia se agasalhou e foi andar pelas ruas de Manhattan procurando um restaurante que lhe saciasse a fome. Manhattan, como o próprio nome soava aos ouvidos, era um bairro sofisticado e caro. Mas cada centavo que ela tinha pago para estar ali, já estava valendo à pena. Entrou num restaurante e se posicionou no bar. Os americanos têm a mania de almoçar e jantar em cima do bar. É para onde os olhos dos frequentadores estão voltados. Você vê e é vista, pensou. Sofia sentou na cadeira e radiografou todo o ambiente. É desconfortável comer no bar, mas não deixa de ser interessante. Além do mais, ela podia observar melhor a decoração daquele bar e mais tarde quem sabe criar alguma coleção inspirada nele. Garrafinhas coloridas...pensou.
Pediu uma salada. Não era porque estava nos Estados Unidos que tinha que comer mal. Ao contrário da fama que o país levava, especialmente em Nova Iorque têm-se lugares bons para comer, o problema é que os marinheiros de primeira viagem se limitam ao famoso hamburguer e se dão por satisfeitos. Mas ela ia e queria aproveitar tudo de bom que a cidade tinha para lhe oferecer. Aquele zum-zum-zum da saída do escritórios faziam os happy-hours mais divertidos. Nem acredito, estou em “New York City”!!! O barman puxou conversa com ela e puderam falar de tudo que ela ainda tinha que conhecer antes de começar o curso. Seriam cinco dias de maravilhosa adaptação. Não queria admitir, mas estava deslumbrada.
Voltou pra casa e dormiu como um anjo, o vinho tinha lhe deixado sonolenta. Amanhã tenho que ligar pra Mahya...
No dia seguinte, Sofia tentou ligar praticamente o dia inteiro para os pais e como não tinha respostas, optou por passear pelas redondezas do estúdio, já estava ficando preocupada. Pensou em ligar para alguma vizinha a fim de saber deles, mas não tinha o telefone de ninguém. O escritório dela estava fechado, era final de semana... Mas quando conseguiu falar com Mahya foi logo derramando um sermão sem eira nem beira. Os ânimos foram acalmados quando a mãe disse-lhe que eles foram, a partir da sugestão dela, ajudar as vitimas do Rio de Janeiro, ao invés de ficarem reclamando da vida, e, por isso, passaram três dias entre ida, vinda e multirão. Sofia ficou sem palavras, foi pega de calças curtas, ou melhor, de mini-saia, suspirou fundo e disse que estava orgulhosa dos pais. “Amanhã vou conhecer a estátua da liberdade, Mahya, depois lhe conto como foi”...